terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Fake Story


Escrevo sobre a apresentação a que assisti do “espetáculo” (e as aspas já entregam minha opinião...) Toy Story, dada no Teatro Municipal Paulo Machado de Carvalho, em São Caetano do Sul, no último domingo, 24 de fevereiro.  Meu menino de três anos e meio é fã da série e, como já gosta de teatro, decidimos levá-lo. Registro esse artigo para que o público que assistiu saiba o que havia de tão errado naquela tentativa de teatro.

Aquela seria a segunda sessão do dia, extra, marcada para iniciar-se às 17h30.  Já na entrada do teatro uma aglomeração tumultuada, sem que alguém se prontificasse a organizar uma fila. No saguão, duas bancas vendiam uma série de bugigangas luminosas piscantes. Como vimos o público da sessão anterior sair carregado das mesmas, imaginamos que teriam algum uso durante a apresentação, algo para propiciar a interação com a plateia (eu sou um otimista incorrigível...).

Para quem não sabe, aquele teatro tem 1.122 lugares (aliás, para quem sabe o número é o mesmo). Para assistir a balé ou concertos é ótimo. Para teatro, porém, é muito grande. Por isso, há uma divisória que reparte a plateia, deixando próxima ao palco uma confortável audiência com cerca de 600 pessoas. Ao adentrar a sala, porém, tal divisória não estava colocada. “Bem, vão usar microfones”, pensei (sou uma pessoa de alma grande e generosa).

Instalados, esperamos até que se completasse meia hora de atraso – o que pode ser comum em shows de popstars, mas é simplesmente inadmissível em teatro. Afinal, eu, espectador, corri, apressei meu filho, minha mulher foi tirando o carro da garagem enquanto eu colocava calçados no menino, viemos a toda pressa, para não nos atrasarmos. Pois, em teatro, atraso é sinônimo de falta de respeito. Se eu entro atrasado (e diversos espetáculos não permitem a entrada com atraso), perturbarei quem esteja assistindo e apresentando. Nesse ponto, uma locução pede desculpas pelo atraso, mas é que havia muita gente saindo da sessão anterior... Ué, se venderam ingressos extras três dias antes, não sabiam que teriam que fazer sair uma população de mais de mil pessoas? Deixo de comentar a parte da locução que enaltece as façanhas da administração municipal no campo da cultura, pois meu gosto pelo bizarro tem limite.  

E, então, tem início a catástrofe. Aparece o Mickey (!) e avisa que assistiremos Toy Story. Três dos soldados de brinquedo entram em cena, a sonoplastia solta a música e eles “dançam”... ou algo parecido. Percebo que um dos soldados erra os passos e – Misericórdia! – olha para um dos parceiros, para acompanhar-lhe o passo. No dia seguinte, uma amiga veio comentar o mesmo que eu vi – só que ela havia assistido à primeira sessão!

E que tolo, eu. Os atores não usavam microfones pela simples razão de que não falavam! As máscaras e bonecos eram até bem feitos, sim. Que bom, pois dentro das fantasias (meus 34 anos de teatro se recusam a chamar aquilo de “figurino”. Figurinos são usados por atores, seres que interpretam) alguma pessoas se movimentavam, enquanto as falas tiradas do filme (falo das dublagens presentes no DVD) saíam pelas caixas acústicas!! Os “atores” presentes não diziam uma palavra. Ou seja, não foi à toa que meu garoto – que sempre corre para a ribalta, participando ativamente de todos os espetáculos a que assiste – tenha ficado acanhado, sem entender muito bem o que ocorria. Ele tem um interação bem maior com os DVDs...
Ainda assim é possível pensar-se em fazer teatro. Existe algo chamado expressão corporal. Com ela percebemos as intenções do ator, em momentos em que se pode, até, dispensar a palavra falada. Gestos, postura, ritmo etc. fazem com que o corpo fale, de maneira bastante eloquente. O que vimos, entretanto, foi expressão corporosa (mistura de corporal com horrorosa), com movimentação desencontrada, repetitiva, simplória. Será que todos ali em cena são atores formados? Digo isso porque, vivenciando o desenvolvimento de uma grande escola de formação de artistas há mais de 25 anos (a conhecida Fundação das Artes de São Caetano do Sul), vejo pelos corredores performances muito mais bem realizadas do que aquelas pelas quais paguei.

Alguém falou em texto? Inexistente, claro. Veja, estou sendo literal: as falas foram copiadas do filme, com as vozes dos próprios dubladores (será que esses dubladores fizeram todo o trabalho novamente? Desculpem-se por não acreditar...). Então, deveria ser um história bacana, como a do filme, certo? Não. Pois, para fazer um espetáculo de uma hora, “editaram”, ou seja, cortaram o roteiro. A peça é, quase toda, um diálogo entre Woody e Buzz Lightyear, que disputam a atenção da Jessie. Sr. Cabeça-de-Batata está presente, mas não me lembro de alguma intervenção sua. À medida em que os personagens entravam, meu pequeno, olhos brilhando, murmurou: “o Dinossauro...”. esperou em vão. Rex não aparece.

Acabada a “atração”, molecada foi até a ribalta, buscando a atenção de seus favoritos. Porém, uma terceira sessão empurrou as crianças em direção a seus pais e à porta.

Comprei, antes de começar, uma das tais bugigangas luminosas (achei que ajudaria o filhote a interagir com as cenas). A caminho de casa, valeu mais o brinquedinho; digo isso pois, ao contrário do habitual, ele não falou nem uma palavra por ter visto seus ídolos. Costuma comentar, sempre, os espetáculos que vê. Esse, não.

Sei, por experiência, que os pequenos queriam um gesto, um sorriso, uma palavra a mais, mas... eles, os personagens, não falavam ou acenavam para as crianças, como fazem atores em teatro infantil.
Ficou claro para mim: aquilo a que assistíramos não era, definitivamente, teatro infantil.

Estou te devendo uma, filho.

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